
Morte e progresso: o pacote de crueldades de Edvaldo para o rio Vaza-Barris

Em março de 2021, o então prefeito Edvaldo Nogueira anunciou com festa e entusiasmo o início de uma nova era para a Zona de Expansão de Aracaju. Com a aprovação da lei nº 5.373, que elevou os povoados Mosqueiro, Robalo, São José dos Náufragos, Areia Branca, Gameleira e Matapuã à condição de bairros, a prefeitura lançou um suposto pacote de obras estruturantes, apresentadas como símbolos de modernidade e desenvolvimento sustentável.
A promessa, no entanto, esconde um custo ambiental e social devastador: vendida como marco do futuro, a principal obra até agora — o canal da Zona de Expansão — ao contrário do que foi amplamente difundido, avança sobre o território sem infraestrutura básica de esgotamento sanitário e sem o devido licenciamento ambiental estadual. A autorização tramitou apenas na Secretaria Municipal do Meio Ambiente, ignorando a obrigatoriedade de submissão à ADEMA (órgão estadual), o que foi contestado em junho deste ano pelo Tribunal de Contas e pelo Ministério Público de Contas.
Obviamente, o prefeito Edvaldo prometeu cuidados com o meio ambiente: espalhou por aí que o canal serviria exclusivamente à drenagem de águas pluviais e que seria integrado a uma rede de esgoto e estação de tratamento — mas nenhuma dessas estruturas existe. Longe dos olhos dos que transitam para curtir um dia de sol à beira do rio Vaza-Barris, a terra está sendo escavada para a implementação dos dutos que tendem a se converter em linha de escoamento para os dejetos urbanos. E em regiões vulneráveis, onde o saneamento básico não é prioridade, o desfecho costuma ser conhecido.
A repetição do modelo que já degradou tantos corpos d’água em nossa capital é uma tragédia anunciada. Sem controle nenhum sobre as ligações de esgoto clandestinas e sem estação de tratamento, o canal projetado para “ordenar o crescimento” pode transformar-se em cemitério de um ecossistema inteiro, repetindo o que aconteceu, por exemplo, nos bairros 13 de Julho, Salgado Filho, Jardins e bairro Industrial.
O foco de resistência ao pacote cruel de Edvaldo parte de pescadores, marisqueiras, lideranças comunitárias, professores e comerciantes, que entregaram ao Ministério Público Federal um dossiê com denúncias sobre a destruição de manguezais e lagoas, perda de modos de vida tradicionais e ameaça ao sustento de centenas de famílias. Para eles, o progresso prometido pela propaganda oficial serviu de aceno às grandes incorporadoras, que expandem suas fronteiras sobre áreas cada vez mais valorizadas e de inestimável valor ecológico, com amparo em leis urbanísticas configuradas com festa e falsas promessas.
Infelizmente, a festejada conversão dos povoados em bairros, vendida em 2021 como progresso e futuro, até o momento tem servido apenas para legitimar mais uma vez a ocupação desordenada, impulsionar especulação imobiliária e intensificar os riscos de um colapso ambiental. Enquanto isso, órgãos de controle, parlamentares como o vereador Camilo Daniel e a Deputada Linda Brasil, além de um pequeno grupo de jornalistas, resistem como podem, na busca de alertar para os danos irreversíveis do pacote de crueldades.
Expandir a cidade sacrificando a fauna, flora e a própria vitalidade dos seus mananciais é um caminho de fácil adesão, mas com consequências devastadoras. Infelizmente, até o momento, o projeto “Aracaju, Cidade do Futuro” se resume a um canal "pluvial" que pode ficar na história não como símbolo de avanço, mas como registro de um pacto entre o poder público e a destruição de parte da Zona de Expansão de Aracaju.
Por Grace Melo - Jornalista (DRT: 1184)
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