Atual Plano Diretor permite crescimento desordenado
17/07/2014 -
O crescimento desordenado e o caos urbano de Aracaju têm aval na legislação municipal que está em vigor desde o ano 2000, amparada por equívocos da Câmara Municipal de Vereadores que promoveu mudanças na Lei Orgânica do Município para alterar o coeficiente único de aproveitamento do solo, que define o espaço a ser edificado em cada terreno disponível na área urbana. Este é o conceito de ambientalista e também dos próprios técnicos da Prefeitura de Aracaju que estão debruçados em estudos para corrigir as distorções da legislação e promover efetivamente a revisão do Plano Diretor, que deveria ter sido feita no ano de 2005.
Com a alteração da Lei Orgânica, o coeficiente único de aproveitamento do solo saiu do patamar máximo de 1, e passou para 3, permitindo que se trabalhe com índices muito mais altos, conforme explicações de representantes da sociedade civil organizada e da própria equipe técnica da Prefeitura de Aracaju. “A ausência da revisão do Plano Diretor permite o crescimento desordenado da cidade e permite a ausência de áreas verdes e de espaço público de convivência social, o que é mais grave”, conceitua a arquiteta Vera Ferreira, membro do Movimento Participe Aju que acompanhou a construção do novo Plano Diretor, que permanece engavetado na Secretaria Municipal do Planejamento.
Como consequência destas distorções, a Atalaia e a Zona de Expansão se tornaram as regiões mais cobiçadas pela especulação imobiliária, localidades onde se encontra o metro quadro mais caro da capital sergipana. Os moradores mais antigos não escondem a preocupação com o grande número de arranha-céu, que está surgindo na região e modificando a bucólica paisagem da orla marítima de Aracaju. "Vai perder a tranquilidade. O fluxo de veículo começa a ser grande, sem contar que estas obras atrapalham muito", comenta a turismóloga Regiane dos Anjos, que reside na Praia de Atalaia. "Falam que não pode construir edifícios altos por causa do aeroporto, mas a gente vê que já estão construindo sem nenhuma infraestrutura, sem rede esgoto... Daqui a pouco vamos virar uma 13 de Julho, com o mar todo poluído", observa a turismóloga.
Por decisão judicial, a tramitação da revisão do Plano Diretor foi suspensa na Câmara de Vereadores e o prefeito João Alves Filho (DEM) o recolheu ao gabinete da Secretaria Municipal de Planejamento com a promessa de fazer os ajustes necessários de forma a evitar os equívocos e vícios encontrados no projeto de lei que já estava em tramitação no Poder Legislativo Municipal.
Como consequência, a Lei Complementar 42/2000 é o retrato do Plano Diretor da capital sergipana, que está atualmente em vigor. O funcionário público Luís Abelardo Mota, que também acompanhou a construção do novo Plano Diretor, provocou a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Sergipe para corrigir vícios da legislação. “Nossa preocupação não é simplesmente com a questão da altura dos edifícios, mas com outros aspectos, a exemplo do adensamento populacional indiscriminado”, considera Abelardo Mota.
Abelardo explica que, em decorrência dos vícios contidos na legislação que está em vigor, permite-se edificações em regiões sem infraestrutura urbana mínima. “Esperamos que o debate volte à tona e sirva para estancar o crescimento desordenado da cidade”, observa. O presidente da OAB/SE, Carlos Augusto Monteiro, se manifestou e assegurou que a entidade já está fazendo os estudos jurídicos para ingressar com ação cível pública para derrubar a atual legislação.
A arquiteta Ana Lucy Neri, diretora de urbanismo da Empresa Municipal de Obras e Urbanismo (Emurb), comunga com a tese de Abelardo, indicando que os equívocos que permitem o crescimento desordenado da cidade estão explícitos na própria legislação, que exclui espaços importantes das edificações do conceito do coeficiente de área computável, que é representado pela soma das áreas dos cômodos das unidades.
Pela legislação em vigor [a lei complementar 42/2000], estão excluídas destes cálculos as áreas destinadas a terraços, varanda, sacadas, jardineiras, garagens ou estacionamentos cobertos. “A atual legislação permite trabalhar com coeficiente de aproveitamento seis, mas pode-se chegar a dez já que estes espaços não estão incluídos na área computável”, observa a arquiteta Ana Neri. “Além de crescer o coeficiente único de aproveitamento do solo, colocaram, na lei, de forma equivocada, a definição de coeficiente de área computável”, observou Ana Neri, numa referência ao artigo 7º inciso XV da lei em vigor.
Na Zona de Expansão, por exemplo, que se permitia um índice máximo de 0,4, a taxa de aproveitamento do solo foi ampliada para 3,5, considerada bastante elevada devido às particularidades daquela região. Na região, os licenciamentos para novas edificações só podem ser emitidos mediante decisão judicial em decorrência dos efeitos da ação cível pública ajuizada pelo Ministério Público Federal. Mas a prefeitura não pode barrar o licenciamento por iniciativa própria já que há embasamento legal para tal, conforme adverte Ana Neri. “Se está de acordo com a lei, não tem como negar o licenciamento”, adverte Ana Neri.
Achismo
A diretora da Emurb, Ana Neri, reconhece a morosidade para a conclusão dos trabalhos que estão sendo realizados pela equipe técnica da Prefeitura de Aracaju no aprimoramento do Plano Diretor, mas justifica alegando se tratar de questão complexa. “Não podemos estabelecer um coeficiente único ideal por achar, é necessário um plano de saneamento ambiental para dizer qual índice é ideal”, opina. “Mas seis é muito alto. Nem São Paulo admite trabalhar com índice seis”, analisa.
Para estabelecer estes índices, o Grupo de Trabalho da Prefeitura de Aracaju está debruçado em estudos de dois planos que darão embasamento ao Plano Diretor: o Plano de Mobilidade, que estabelece limites para implantação do BRT (Bus Rapid Transport) – já concluído, segundo a arquiteta; e o Plano de Saneamento Ambiental, que está em fase de elaboração com a parceria da Universidade Federal de Sergipe (UFS).
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