O taxista Roberto Basílio confirmou, em juízo, a versão de tentativa de assalto supostamente praticada por Ítalo Bruno Araújo Fonseca, enteado do secretário de Estado da Segurança Pública. O crime teria ocorrido na madrugada do dia 25 de maio deste ano na Praia de Atalaia durante falsa abordagem policial articulada pelo enteado de João Eloy e pelo amigo dele, identificado como Eduardo Aragão de Almeida.
A versão de tentativa de assalto foi ratificada pelo taxista em depoimento concedido nesta terça-feira, 11, na 2ª Vara Criminal, na audiência de instrução e julgamento comandada pelo juiz Leonardo Souza Santana Almeida. Ao Portal Infonet, em entrevista concedida após prestar o depoimento, o taxista revelou que não tem dúvida que o intuito dos dois rapazes seria efetivamente cometer o assalto, mas não entendeu os motivos da desistência.
Uma das passageiras ocupantes do veículo naquela madrugada também prestou depoimento, mas não confirmou nem também desmentiu a versão do taxista, embora tenha observado certa contradição entre o depoimento do taxista e a conversa que o profissional manteve com os clientes após a ação do enteado de João Eloy.
A testemunha informou, em juízo, que, “a princípio”, pensou que efetivamente eles estariam sendo vítimas de uma tentativa de assalto e que teria determinado ao taxista para levantar o vidro e sair do local antes que o crime fosse consumado. A testemunha diz até que se arrependeu do comportamento que teve no momento porque poderia caracterizar uma reação a um assalto.
No entanto, segundo o depoimento da testemunha, o próprio taxista não vislumbrou assalto após deixar o local com os passageiros. A testemunha revelou que durante o trajeto [até o destino final dos clientes] todas as possibilidades foram cogitadas nas conversas que foram surgindo entre os passageiros e o taxista. “Ele não sabia o que realmente estava acontecendo e até disse que poderia ter sido uma abordagem policial”, enfatizou a testemunha demonstrando surpresa com a versão do taxista de que efetivamente se tratava de assalto.
No diálogo, segundo a testemunha, o taxista até observou que as abordagens policiais eram comuns na região. “E eu fiquei surpresa quando fiquei sabendo que ele [o taxista] falou sobre assalto, achei que há uma certa contradição”, considerou. No entanto, a testemunha reconheceu que sentiu medo e, no momento em que prestava depoimento, constrangimento. “Reviver a situação é constrangedor”, falou ao prestar o depoimento.
Amarok da SSP usada para cometer crime (Arquivo Portal Infonet)
Ao Portal Infonet, o taxista Roberto Basílio revelou que, no momento, tentou tranquilizar os passageiros e que todos os integrantes do veículo, inclusive ele próprio, fizeram várias conjecturas sobre os reais interesses dos dois homens que ocupavam aquela Amarok de cor branca [posteriormente identificados], sem compreender os motivos que levaram os homens a desistir da ação depois que ele deu partida ao veículo, atendendo a sugestão da cliente.
“Conversando com os passageiros, coloquei várias situações. A gente ficou analisando o que poderia ter acontecido, porque eles desistiram do assalto”, ressaltou o taxista. “Mas os advogados analisam esta frase para livrar a cara deles”, ressaltou.
Desmentido
Aos ouvidos da defesa, o depoimento da testemunha que estava entre os passageiros do taxi soou como um desmentido à versão de tentativa de assalto ratificada pelo taxista. “A defesa gostou da instrução porque foi afastada pelas testemunhas que estavam no taxi a tentativa de assalto, tendo sido o taxista desmentido”, considerou o advogado Guilherme Maluf, que atua na defesa do enteado do secretário João Eloy.
O advogado Samuel Daud, que defende Eduardo Aragão, revelou que o cliente não estava naquela abordagem específica. Nas entrelinhas, ele deixa claro que Ítalo Bruno teria agido sozinho contra o taxistas e aqueles clientes e que Eduardo Aragão estaria numa boate e que fora procurado pelo amigo. “Meu cliente não estava na abordagem ao taxista. Ele entrou [no carro] depois. Eduardo estava na boate e Bruno chegou afoito, preocupado e muito nervoso e Eduardo tentou acalmá-lo”, observou Daud, reconhecendo que o cliente participou de outra abordagem por eles realizada no mesmo dia na Passarela do Caranguejo, usando o carro e as armas da Secretaria de Estado da Segurança Pública.
Foi na Passarela do Caranguejo que os dois foram localizados, receberam voz de prisão dos policiais militares e encaminhados para a Delegacia Plantonista, de onde foram liberados depois que prestaram esclarecimentos.
A divergência entre a defesa e a tese apresentada pelo Ministério Público está apenas na tipificação quanto ao porte ilegal de arma, mas há entendimento, de ambas as partes, pelo crime de usurpação de função pública. Segundo explicações do advogado Samuel Daud, o Ministério Público entende que o cliente dele deve ser condenado por porte ilegal de arma de uso restrito e também por porte ilegal de uso permitido [crimes previsto, respectivamente nos artigos 16 e 12 da Lei do Desarmamento], mas a defesa entende que Eduardo apenas cometeu crime de porte ilegal de arma de uso restrito já que ele estava com um rifle da SSP no momento em que foram abordados por policiais militares na Passarela do Caranguejo.
Policiais
Três policiais militares que atenderam a ocorrência também prestaram depoimento nesta terça-feira, 11, arrolados como testemunhas. Os policiais relataram toda a ocorrência, inclusive confirmado que teriam sido mobilizados pelo Centro Integrado em Operações em Segurança Pública (Ciosp) para atender à tentativa de assalto que estaria sendo cometida por integrantes de uma Amarok e, entre as vítimas, estaria o taxista que teria acionado o Ciosp depois de deixar os passageiros no destino solicitado pelo grupo.
Os policiais informaram que as câmeras de monitoramento instaladas na orla registraram o momento em que Ítalo Bruno e Eduardo Aragão estavam exibindo armas, fazendo abordagens na área de estacionamento na Passarela do Caranguejo. Mas todos descartaram a possibilidade do secretário João Eloy e do coronel Maurício Iunes, comandante geral da Polícia Militar, ter agido para impedir os procedimentos legais contra os acusados.
Mas deixaram claro que servidores da Secretaria de Estado da Segurança Pública tentaram impedir o andamento da ocorrência, inclusive com participação de policiais militares. Um deles, os depoimentos dos policiais, teria tentado tomar a chave do carro para impedir a vistoria no veículo, no momento em que os policiais agiam para apreender o veículo e as armas e conduzir os acusados para a Delegacia Plantonista.
A promotora de justiça Juliana Checcucci Carballal, titular da 2ª Vara Criminal, admite que a denúncia pode mudar de rumo. “Vemos que há dois depoimentos conflitantes, mas não acaba a instrução. Há contradição, mas vamos ouvir outras testemunhas e, se for necessário, haverá nova acareação”, considerou, confirmando que todos os depoimentos serão analisados.